A Polícia Civil do Rio de Janeiro, por meio da 134ª DP (Campos dos Goytacazes), instaurou um inquérito para investigar as ofensas racistas feitas pelo advogado José Francisco Abud contra a juíza Helenice Rangel Gonzaga Martins, titular da 3ª Vara Cível da cidade. A magistrada foi alvo de declarações discriminatórias após indeferir um pedido feito pelo advogado em um processo judicial.
De acordo com a delegada Carla Tavares, responsável pelo caso, Abud deve ser ouvido na próxima semana. Antes disso, a magistrada será ouvida para esclarecer a dinâmica dos fatos. A polícia já realiza diligências para colher novas provas e apurar a conduta do advogado, que será investigado pelo crime de racismo.
As declarações racistas
As ofensas foram feitas em uma petição anexada ao processo, na qual Abud utilizou termos discriminatórios para criticar a magistrada. Entre os trechos registrados, destacam-se:
- “Magistrada afrodescendente com resquícios de senzala e recalque ou memória celular dos açoites”, referindo-se à negativa do pedido feito no processo.
- “Decisões prevaricadoras proferidas por bonecas admoestadas das filhas das Sinhás das casas de engenho”, tentando desqualificar os posicionamentos da juíza.
Reações das instituições
As declarações do advogado geraram forte repúdio por parte de diversas instituições do sistema de Justiça.
• Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ):
O tribunal classificou as ofensas como incompatíveis com o respeito institucional e afirmou que a conduta do advogado fere princípios éticos e legais da advocacia, além de atingir diretamente a honra e a dignidade da magistrada.
• Associação dos Magistrados do Estado do Rio de Janeiro (AMAERJ):
A entidade manifestou solidariedade à juíza Helenice Rangel e condenou veementemente a postura discriminatória e injuriosa do advogado, reforçando o compromisso da magistratura no combate ao racismo e à discriminação.
• Conselho Nacional de Justiça (CNJ):
O CNJ repudiou as ofensas e destacou que o episódio não atinge apenas a honra da magistrada, mas também afronta o Poder Judiciário. O órgão lembrou iniciativas como o Pacto Nacional do Judiciário pela Equidade Racial e o Protocolo para Julgamento com Perspectiva Racial, que buscam combater o racismo estrutural no sistema de Justiça. O conselho ainda cobrou punição rigorosa para os responsáveis.
• Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ) e OAB Campos:
A 12ª Subseção da OAB/RJ, que abrange Campos dos Goytacazes, repudiou a atitude do advogado e instaurou um processo ético-disciplinar para apurar o caso. A entidade reforçou que não compactua com manifestações racistas, machistas ou violentas e reafirmou seu compromisso com a defesa da igualdade e do respeito no exercício da advocacia.
O inquérito foi encaminhado ao Ministério Público do Rio de Janeiro (MPRJ), que pode oferecer denúncia contra Abud por racismo. Além disso, a OAB-RJ avaliará possíveis sanções disciplinares, que podem ir de advertência até expulsão dos quadros da advocacia.
A reportagem não conseguiu contato com José Francisco Abud para comentar o caso.